domingo, 16 de outubro de 2016

friend

friend.  this
is the word that
is my candle, my
winter sun, my
sky.  not 'lover',
'father', 'mother',
closer perhaps
to 'sister'.  i can
say 'vente, hermana'
but leave the shutters
open for  my
friend.  parade of
desert horses along
 a cliff. crest
of light. how
 you appear
coming in from
a thundershower,
or the eye of the
storm.  tattoo
on the nape of
the neck. s/he.
wind blowing us
together.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Bisbilhotice

 (Versão traduzida da minha crônica "Eavesdropping" )


Ok, tudo bem, pode ser que a bisbilhotice seja um pecado capital, mas quem pediu pro cara me obrigar a ouvir sua conversa privada enquanto eu simplesmente cuidava da minha vida, apreciando uma exposição de fotografias no saguão do Forum des Images em Les Halles?  Claro que eu poderia ter bons motivos para ficar escutando, por exemplo, para melhorar minha compreensão auditiva do francês, ou não perder uma oportunidade fortuita de me munir de um valioso conhecimento cultural, sabe,  de ouvir um cara na meia idade com todo o tipo de intelectual francês falando com uma ex-namorada.  Afinal,  essas coisas sempre tem algo de, bom, vamos dizer, antológico.  Talvez, ontológico.  Mas preciso admitir que o que realmente chamou minha atenção foi que o belo espécime me lembrava bastante de alguém que eu tive a oportunidade infeliz de conhecer num momento da vida que errado, sempre seria. Ou talvez fosse um compósito de dois mais ou menos parecidos.  Ora, para o propósito deste relato, vou batizá-lo com o nome "Gérard'.  Ou pensando bem,  vou chamá-lo de Piotr.   Porque não tenho 100% de certeza dele ser francês.  Por outro lado, o que posso dizer com absoluta certeza é que a Núria, com quem ele falava, de modo algum era francesa.  Porque o Piotr ficava perguntando para ela, em francês,  se ela estava entendendo, e pior ainda, naquele duplo sentido, tipo, 'Está me entendendo a língua que falo?  E está se tocando?', intercalando frases em inglês com um sotaque que agora sim eu podia dizer tinha mais do Leste Europeu do que da Franca, só para garantir que a Núria não perdesse algum nuance crítico ... A estas alturas, eu estava totalmente cativada, me esforçando para caramba,  para entender todinho em francês e ainda imaginar o que a sujeita que estava do outro lado da linha lhe respondia. Ah, por sinal, sabia que o nome dela era Núria, porque ele a chamou assim repetidamente, mas só após ter chamado ela pelo nome, "Natalya",  sem querer, que eu já estava sabendo que era o nome da namorada atual, com quem ele morava, pois ele tinha explicado tudo isso muito lenta e pedagogicamente à coitada da Núria, que com certeza já sacava que suas esperanças de voltar com o Piotr tinham sumido como a fumaça de todos os cigarros de todos os pátios dos bares de Paris.  A tensão que permeava o saguão elevava-se, o Piotr andando nervosamente de um lado para outro, bufando e se segurando para não perder as estribeiras, tanto que eu tive que parar de olhar para as fotografias que o Christian Póveda fez dos membros do gangue  Los Mara de El Salvador (e que finalmente lhe custaram sua vida) e só ficar aí quieta absorvendo o cena.  Pior ainda, após ter passado uma semana fazendo reflexões obrigatórias sobre o patriarcado global e a triste realidade dessa frase brasileira, Só mudam de endereço,  eu com certeza estava com um presunçoso sorriso no rosto, de quem acha que já sabe, que já viu tudo.  Ou peraí.  Pode realmente ser que eu tenha descoberto uma diferença, sobre esse assunto de quem 'só moram em casas diferentes', sabe?  Veja, não consigo realmente imaginar a pessoa ou pessoas que esse cara fez lembrar andando desse jeito,  trotando e bufando ao redor da sala; mais provavelmente, eles estariam sentados,  com um meio sorriso de malandrinho, quem sabe até  orgulhosos de si mesmos, enquanto apreciavam mentalmente os despojos espalhados por sobre a paisagem de Conquistas passadas. Talvez até soltando algum comentário ambíguo, sedutor aqui e ali para  fazer a coitada da Núria pensar que ele poderia, quem sabe, eventualmente, se cansar de Natalya (então por que não manter uma pequena centelha de esperança viva, né,  Nuria?)  Mas Piotr, aparentemente,  estava apenas irritado e estressado.  Enquanto segurava entre grossos dedos o cigarro que logo sairia para fumar,   informava a essa chata da Núria ( quem eu já deduzia ser uma dessas meio viciadas no sofrimento amoroso)  que ela era bem-vinda a ficar em sua casa,  se ela na sua viagem iminente passasse por Paris; mas é claro, ele estava vivendo com Natalya e ela teria - pois a vida é assim! -   teria que estar disposta a  dormir no sofá.

Grata a Takeshi Ishihara  pela revisão e sugestões.