Então, vamos lá...
Primeiro trecho (trecho que abre o capítulo 7 pp. 101-102) traduzido do livro de memórias da escritora mais reconhecida da geração Beat, Diane di Prima. Entre mais eu leio dela, e de suas amigas e colegas (as "personagens menores" como foram ironicamente denominadas por uma delas, Joyce Johnson) mais lamento não ter conhecido sua obra antes ... e mais agradecida fico por ter tido o incentivo de começar a conhecê-las agora:
“Quando eu falo, como por vezes faço, com outras pessoas sobre minha vida,quando perguntam, ou tentam descobrir o que significou para mim, naqueles tempos, decidir ser poeta, e daí, na seqüência, pôr isso em prática, agir nesse sentido, muitas vezes me dizem, ‘Ah é, sem dinheiro, mas ganhou fama; a fama precoce deve ter sido uma recompensa’. E eu os olho com estranheza, me perguntando como eles imaginam esses primeiros apartamentos, esses quartos vazios, essas caixas servindo de mesa e cadeira, e finalmente, um neném deitado em algum canto. Fama, eu pergunto tentativamente, tive fama?
O que eu sei é que escolher ser artista: escritor, bailarino, pintor, músico, ator, fotógrafo, escultor, você o diga, escolher ser qualquer um deles nesse mundo em que eu cresci, o mundo dos anos 40 e começo dos anos 50, era fazer a escolha mais completa que havia nesses tempos, viver uma vida de renunciante. Uma vida de sadhu, de santo itinerante, fora do marco das leis dessa cultura particular e peculiar.
Era um mundo em que a religião em si era suspeita, e por bons motivos. 'Religião' como a gente a conhecia, se limitava à modalidade judaico-cristã – ‘Protestante, católico ou judeu?’ nos perguntavam, ao entrar no hospital ou numa escola. E era um mundo que era impossível de aceitar com a consciência tranqüila. Não era aquilo que os liberais dos anos 40 ou 50 gostariam que a gente acreditasse, aquilo que eles tinham sonhado – um mundo onde o progresso era um dado e a sociedade humana em si um valor. Nós artistas renunciantes fora-da-lei – os que seriam renunciantes – não encontravam nela nenhum valor. Nesse impulso de ascender e progredir na América de 1950, onde não existia nada alem do mundo de cada dia, a maneira mais clara de afastar-se do materialismo era direcionar-se às artes.
Ser uma paria, um outsider, era essa a vocação. Nem fama, nem publicação. Manter as mãos limpas, não pertencer. Ao manter-se do lado de fora, a gente sentia que as guerras, as massacres, os erros não eram nossos.
(Me lembro de um jovem imigrante, anarquista, Francisco, um espanhol que como muitas outras pessoas nesses anos após a Segunda Guerra Mundial foi encarcerado, por estar na América sem papéis. Depois o deportaram para a Espanha de Franco, onde em pouco tempo foi assassinado. Mas quando estava na prisão em ou perto de Nova Iorque, as autoridades descobriram que ele era padeiro. Tentaram pôr ele para trabalhar na cozinha. Francisco se recusou, fazendo greve de um homem só. ‘Não farei nada’ ele disse, no seu inglês com forte sotaque, ‘que apóie esta casa’. Era o que todos sentíamos – tornou-se nosso grito de mobilização. E o continuou sendo, muito tempo após a desaparecimento de Francisco.)
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sábado, 27 de agosto de 2011
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