“...Onde
andará?
("Onde
andará?" é das perguntas mais tristes que conheço,
sinônimo
de se perdeu)”.
(Caio
Fernando Abreu)
Foi
numa quarta-feira bastante ensolarada para o típico de uma cidade como
Curitiba, um desses dias em que você se permite uma manhã sem aulas
e sonos mais longos. Já era próximo das 11 horas, início dos
preparativos para o pontual almoço ao meio-dia, quando de repente
alguém bate palmas no pequeno portão branco que dá para a rua.
Apressada, enxugo minhas mãos num desses panos que minha mãe
insiste em fazer bicos coloridos de crochê, atravesso a sala
passando rapidamente os olhos pela TV ligada sem me concentrar na
programação do dia. Enfim chego à janela, avistando através dela
uma mulher de cabelos curtos um tanto desgrenhados, trajando roupas
surradas. Segurava numa das mãos um desses guarda-chuvas pretos e
grandes que você compra em qualquer esquina ou na saída do Shopping
Center em dias de chuva. “Diga!”, foi à primeira coisa que disse
quando a vi. “Preciso devolver esse guarda-chuva pra Sandra, sua
vizinha!”. Meio confusa, comecei a puxar pela memória de onde
conhecia aquela mulher agitada e de palavras rápidas. Lembrara dela
transitando pelo bairro há algumas semanas, sempre conversando com
amigos imaginários e pedindo café preto com pão na casa daqueles
que seriam meus vizinhos. Pela memória tentei puxar também o nome
daqueles que moravam a minha volta, mesmo sem saber quem eram – eu
conhecia muito pouco meus vizinhos. “Maria”, o “Pastor Carlos”,
“Elisabeth”, e até aquela que veio de Quatiguá… como é mesmo
o nome dela? Todos, menos Sandra! Rapidamente, comuniquei a ela que
estaria havendo algum engano, que nenhuma vizinha tinha esse nome.
Desesperada, começou a estalar os dedos no ar como que numa
tentativa de lembrar quem era a tal dona do bendito guarda-chuva.
“Letícia!”. “Foi a Letícia… aquela que mora ali em cima!”.
Depois de muito insistir “que não”, e ela “que sim”, num
gesto de quase bondade peguei o guarda-chuva de sua mão. Com um
sorriso de “dever cumprido”, me desejou um bom dia e me disse
obrigada. Apressadamente, deixei o objeto motivo dessa pequena -
grande confusão perto da soleira da porta da sala e voltei para as
panelas, comentando o ocorrido de forma engraçada com minha irmã
mais nova que acompanhou nossas falas de dentro de casa. Agora, todos
os dias que abro a porta que dá para a rua, me deparo com o grande
guarda-chuva, e me pergunto: “por onde andará Letícia?”.
HELOIZE
SOUZA MONTOWSKI