Do livro de Jane Tompkins, "West of everything: the inner life of
Westerns " (Oxford University Press, 1992):
" Então a questão é a seguinte: o que fazem os cavalos nos filmes de faroeste? Sua presença nos parece natural, mas durante grande parte do século XIX os cavalos pouco apareciam nos romances populares. Sua aparição paulatina – primeiro nos dime novels[1], depois em grandes best-sellers e em filmes, ao começo do século XX – coincide com o desaparecimento dos cavalos da vida cotidiana, onde foram empregados como animais de trabalho e como meio de transporte. Isto sugere que os cavalos nos preenchem nosso anseio de ter um tipo diferente de existência. Anti-modernos, anti-urbanos e anti-tecnológicos, eles significam uma existência sem carros e telefones e electricidade. Mas podemos ter narrativas que se desdobram no sítio ou pequenas vilas, que abraçam a vida simples sem preenche-las com cavalos? Porque cavalos particularmente? E porque só de determinado tipo? Pois não é principalmente o animal de tração que associamos aos filmes de faroeste, ou o cavalo como animal de exposição, senão os cavalos montados por homens, entrando ou saindo da cidadezinha a galope rasgado, esboçados no planalto olhando para longe, ou vindo a todo vapor na tua direção puxando uma diligência fugitiva, tocando bezerros perdidos que se aproximam a um despenhadeiro ou simplesmente correndo selvagens e livres.
" Então a questão é a seguinte: o que fazem os cavalos nos filmes de faroeste? Sua presença nos parece natural, mas durante grande parte do século XIX os cavalos pouco apareciam nos romances populares. Sua aparição paulatina – primeiro nos dime novels[1], depois em grandes best-sellers e em filmes, ao começo do século XX – coincide com o desaparecimento dos cavalos da vida cotidiana, onde foram empregados como animais de trabalho e como meio de transporte. Isto sugere que os cavalos nos preenchem nosso anseio de ter um tipo diferente de existência. Anti-modernos, anti-urbanos e anti-tecnológicos, eles significam uma existência sem carros e telefones e electricidade. Mas podemos ter narrativas que se desdobram no sítio ou pequenas vilas, que abraçam a vida simples sem preenche-las com cavalos? Porque cavalos particularmente? E porque só de determinado tipo? Pois não é principalmente o animal de tração que associamos aos filmes de faroeste, ou o cavalo como animal de exposição, senão os cavalos montados por homens, entrando ou saindo da cidadezinha a galope rasgado, esboçados no planalto olhando para longe, ou vindo a todo vapor na tua direção puxando uma diligência fugitiva, tocando bezerros perdidos que se aproximam a um despenhadeiro ou simplesmente correndo selvagens e livres.
Com os cavalos nos remontamos à alguma coisa no passado, lá pelos anos
1870, 80 e 90 após a Guerra Civil. Mas o
que trazem não é só alguma noção geral da existência humana. As pessoas têm contato físico próximo com os
cavalos, os tocam; apertam seus corpos humanos
contra os dos seus animais. Que antes de mais nada são vivos, grandes, poderosos
e velozes. Que não são humanos mas não
escapam do controle humano; são perigosos, até letais, mas maleáveis à vontade
humana.
A
chave para aquilo que os cavalos representam nos filmes de faroeste é muito
simples. Está no fato que o corpo do cavalo descansa sob o corpo do cavaleiro,
entre o ser humano e a terra. Os cavalos
exprimem nossa necessidade de uma conexão com a natureza, com o selvagem. Mas é
a natureza em uma forma particular. Não
os pássaros que cantam nem a força do córrego nem as violetas ao lado de pedras
cobertas de musgo, mas potência,
movimento e força posto sob controle e em contato com o corpo humano. É por
cima de tudo é a existência física dos cavalos que os torna indispensáveis nos
filmes de faroeste. Sua presença dinâmica e material, sua energia e
corporalidade mandam sinais aos corpos dos espectadores, aos nossos corpos. Um
filme trás outro começa com a pequena figura de cavaleiros esboçados contra o
horizonte, crescendo conforme se aproximam da câmera, até você poder ouvir as
batidas do seus cascos, ver o branco dos seus olhos, excitar-se com sua massa e
movimento. Chegam até a câmera , para que possamos sentir o prazer vicário do
contato com sua pele, seu hálito, sentir sua força e seu fôlego, absorver o
fluir de sua força. Os cavalos estão aí
para nos mobilizar. Mas do que qualquer
outro elemento do gênero, eles simbolizam o desejo de recuperar alguma conexão
com a vida que foi perdida.”
( pp.93-94)
Tradução: Miriam Adelman
[1] Tipo de literatura que caracteriza o início do mercado editorial norte-americano, no final do século XIX e início do século XX. O termo vem do preço dos livros : "dime" refere-se à moeda de dez centavos do dólar.
Cool
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