Caminhávamos de mãos dadas até uma esquina
Quando vc me olhou triste, a dizer
Coisas estranhas sobre a liberdade
Olhei para o mar e vi cortinas de chuva no horizonte
Era fevereiro e tantas pessoas se divertiam
Não entendo bem metáforas
Tampouco vejo presságios nos voos dos pássaros
Passeávamos como um casal de dálmatas alegres
Lembrei da tapeçaria com o tema da caça ao cervo
Contávamos cães e cervos
Não queria olhar para trás: seria quer balizar
Algo não mensurável, o tempo
Baixei os olhos e temi a morte
Brincaria com os pêlos do seu braço se ninguém nos visse
De alto de um templo você me oferecia o mundo
E éramos como uma foto de revista, editada
Cena de filme de um ou outro cineasta engajado
Completamente underground para o resto
Num bar, homens jogavam cartas
Jamais invejei tanto o grito de “seis”
Uma mulher olha pra seu calção de linho branco
E para sua camiseta de listras azuis
Já não sinto mais aquele misto de compaixão
Ciúme, ironia
Porque
Caminhávamos de mãos dadas até uma esquina
Quando, sem jeito, você começou a questionar a liberdade
Com palavras estranhas
Vi seu corpo difuso num dark-room de São Francisco
Numa viagem a Madrid, a ler guias queer
E os azulejos brancos dos banhos públicos modernos
Onde as águas são a um só tempo
Mais e menos que disfemismos baratos
A procurar o amor nas praças, nuança mais negra de Eros
Andávamos juntos até uma esquina
Quando você me disse coisas tristes sobre a liberdade
Sob a imagem de um Heliogábalo
Emplumado num carro alegórico de 20 metros
A dançar, a girar
Como um demônio vermelho
Ambíguo por natureza e força
Num baile de máscaras aberto
Angélico nas formas femininas
Luciferino porque andrógino
Caminhávamos juntos até uma esquina
De mãos dadas até o fim
Porque eu vi dois rapazes a andar de bicicleta
E fiquei a admirá-los até que desaparecessem.
Poem for my twenty years
(translated by Miriam Adelman)
Hand in hand we strolled to the street corner
Where you found me with your sad
gaze, to
Pronounce strange words on freedom
And I looking to the sea found
curtains of rain on the horizon
It was February and so many
people were out having fun
I don't understand much about
metaphor
Nor do I find omen in the flight
of birds
We strolled along like a cheery
pair of dalmations
I remembered the tapestry with its deer-hunting
motif
How we counted dogs and deer
I had no desire to look backwards: which would
be a beacon to
Something incommensurable, time
itself
So I lowered my gaze, felt fear
of death
I would have caressed the hair
along your arm were no one to see us
From high atop the temple you
offered me the world
And we were like a magazine shot,
scene
Cut from a film of some committed
film director
From the unrecognized underground
There in the bar, men were playing cards
I never so envied that cry of "six!"
A woman stared at your white linen
trousers
At your blue-striped tee shirt
Gone now my mixture of compassion
Jealousy, irony
Because
There we strolled hand in hand to the
corner
Where clumsily you began to question freedom
With your strange words
I envisioned your body diffuse in a San
Francisco darkroom
Or on a trip to Madrid, reading queer guidebooks
The white tiles of modern public bathrooms
Where waters flow in one sole tempo
More or less than cheap old dysphemisms
Searching for love in city squares, Eros in its darkest nuance
We strolled together to the street corner
Where you began sad words on freedom
Under the image of a plumed Elagabalus
Parading twenty meters high atop a float
Dancing, swiveling
Like a red demon
Ambiguous by nature and force
At a masquerade ball open to all
Angelical in feminine forms
Androgynously Lucifer-like
We strolled together to the street corner
Hand in hand till the end
Where I saw two boys riding their
bicycles
And stayed to watch until they
disappeared.