Versão minha, preliminar, quase rascunho, do poema com que Diane di Prima,
a mais reconhecida das poetas Beat, começa seu livro LOBA. O poema, pelo que percebo,
é do início dos anos 70.
Ô minhas
irmãs perdidas da lua
arco
nos cabelos, o mar embaixo dos pés, vocês perambulam
com
véu azul, folha verde, xale rasgado, perambulam
com a pele
de folha de ouro, cabelo incendiado, perambulam
na
Avenida A, na Rua Bleecker, perambulam
com
coroa de flores, hálito prateado,
perambulam
pisadas
madrepérola brilhante
atrás de vocês
olhos de pedra lunar
onde a lua crescente
com
luvas, com chapéu, farrapos, peles, miçanga,
sob
a lua minguante, o cabelo escorrendo na chuva preta
uivando
com os cães de rua, silvando nas portas
sombras
vocês são, projetadas nas encruzilhadas, nas rodovias
atravessando
as ruas na diagonal, perambulam
cuspindo,
perambulam
resmungando e chorando, perambulam
envelhecidas
e falando sozinhas
com olhar distraído, perambulam
loucas por uma transa rápida, perambulam
chorando
seus mortos, perambulam
nuas, caminham
enfaixadas em longos
vestidos, caminham
vestidas de mortalha,
caminham
andando para trás,
caminham
famintas
famintas
famintas
gritando as escuto
cantando as escuto
maldizendo as escuto
orando as escuto
vocês deitam com o unicórnio
vocês deitam com a Naja
vocês
deitam na grama seca
vocês deitam com os yéti
vocês
giram os longos pintos dos sátiros com suas línguas
armadas estão
conduzindo carros de guerra vão
muito mais altas do que eu são
pequenas são
acuadas nas ladeiras estão
fora dos ventos
grávidas,
perambulam
descalças,
perambulam
espancadas
por homens bêbados, perambulam
vocês
matam em mesas de aço
dão à luz em camas negras
o
feto que arrancaram enrijece na neve,
sobe como uma lua nova
vocês gemem enquanto dormem
cavando
por inhame, perambulam
procurando
embriagantes, perambulam
brincando
com pássaros, perambulam
entalhando
pedra, perambulam
eu
ando a noite longa, procurando vocês
eu
subo a crista da onda, procurando vocês
eu
deito nas pradarias, bato nas cercas de pedra
chamando
seus nomes
vocês são de coral
são de lápis e turquesa
cérebro
que se enrosca como uma concha
vocês dançam nos morros
usuárias
de substâncias pesadas, vocês rodopiam
dançam nos metrôs
ocupam
os prédios
as
crianças lambendo suas tetas
vocês
são as colinas, o formato e a cor dos planaltos
são
as tendas de pele, as ocas
os
vestidos de pele de búfalo, as colchas, as blusas tricotadas
são
as caldeiras e a estrela da noite
que se eleva sobre o mar, cavalgando a escuridão
eu
me movo junto, acendo a fogueira noturna
meto minha mão e como sua carne
você minha imagem no espelho, minha irmã
que
desaparece como fumaça na colina nevoada
você
que me conduz a cavalo pela floresta de sonhos
grande mãe cigana, deito minha
cabeça nas suas costas
sou você
e devo me tornar você
eu fui você
e
devo me tornar você
sou
sempre você
devo
me tornar você
ay-a
ay-a ah
ay-a
ay-a-ah ah
maya ma maya ma
om star mother ma om
maya ma ah
versão: Miriam Adelman
Meus agradecimentos a Alexandra Barcellos e Álvaro Posselt pelas sugestões.